Fotossíntese artificial: um futuro próximo?
Você sabe o que é a fotossíntese?
É um conjunto complexo de reações químicas que resultam na produção da glicose, molécula essencial para que a vida possa existir na Terra. Na fotossíntese, as plantas (e outros organismos com clorofila) captam gás carbônico (CO2), água e luz solar e, assim, produzem a molécula que dá energia para os seres vivos: C6H12O6.
Veja a equação da fotossíntese:
A glicose é transferida dos organismos produtores para os organismos consumidores, através das diversas relações ecológicas que existem.
Para entender isso melhor, viaje comigo para a Mata Atlântica, um importante bioma brasileiro com altas taxas de desmatamento. Nesse ambiente, encontramos, por exemplo, o mico-leão-dourado, animal onívoro que se alimenta de diversos frutos. Os frutos vêm de plantas, organismos que realizam fotossíntese. O mico utiliza essa glicose, produzida pelas plantas, para se manter vivo. Ele, por sua vez, pode ser presa de um outro mamífero, como a onça pintada. Isto é, mesmo que a onça não coma frutos, ela depende da fotossíntese para viver.
Já deu para entender que esse processo é essencial para a existência de vida, certo? Por isso, um grupo de pesquisadores decidiu explorar as estruturas e reações químicas envolvidas na fotossíntese e reproduzi-las em estruturas sintéticas.
Mas por que desenvolver a fotossíntese artificial?
Compreender esse processo e ser capaz de reproduzi-lo em laboratório pode ser um grande avanço científico no que diz respeito à capacidade de produzirmos biomoléculas e biosistemas que resultem em formas de vida artificiais autossustentáveis. Isso poderia ser aplicado, por exemplo, para reduzir os efeitos da mudança climática pelo excesso de gás carbônico na atmosfera, usando a tecnologia em biorreatores.
Além disso, esse avanço abre portas para que outras moléculas possam ser desenvolvidas a partir de sistemas biológicos produzidos em laboratórios. Poderíamos desenvolver medicamentos com a utilização de sistemas biológicos e, quem sabe, produzir medicamentos com ações mais específicas e com menos efeitos colaterais.
Os cloroplastos artificiais
No interior das células vegetais, existem organelas celulares chamadas cloroplastos. No seu interior, as moléculas de clorofila estão organizadas nos tilacóides, local onde a fotossíntese começa. O conjunto de reações para produzir glicose termina no estroma, que podemos dizer que é parte líquida/gel no interior do cloroplasto.
Além da clorofila, há muitas enzimas e rotas enzimáticas envolvidas na produção de glicose. Pesquisadores da França e Alemanha conseguiram produzir cloroplastos em seus laboratórios.
As organelas artificiais foram criadas a partir de microfluídos com água suspensa em óleo, e, assim, os compartimentos para as reações estavam formados. Isso foi possível por causa da baixa afinidade que existe entre as moléculas de óleo e água. Com relação às enzimas envolvidas no processo, foi usado um conjunto de 16 proteínas que já haviam sido desenvolvidas por um outro time de pesquisadores. As proteínas com função enzimática foram combinadas com os tilacóides extraídos de plantas de espinafre.
Os resultados foram positivos. Os cloroplastos híbridos foram capazes de assimilar o carbono do C02 e transformá-lo na glicose. O processo foi mais eficiente que a fotossíntese natural, por não envolver as reações químicas da fotorrespiração, conjunto de reações que acabam desperdiçando energia.
Quais os próximos passos?
Com os experimentos realizados até agora, provou-se que é possível reprogramar processos biológicos e utilizar novas rotas bioquímicas de origem sintética e/ou biológica. Os pesquisadores defendem que será possível desenvolver reações bioquímicas mais eficientes e fazer com que elas aconteçam nas células, transplantando estruturas híbridas ou artificiais. Ou seja, estamos no caminho certo para a vida sintética.
Agora que já temos a rota para a produção de glicose utilizando cloroplastos produzidos em laboratório, os cientistas precisam descobrir como possibilitar que as células sintéticas sejam capazes de manter suas estruturas funcionais. reparando-as e se reproduzindo.
Quer explorar mais o tema? Acesse o artigo da revista Science.
Fundador do canal Ciência em Ação, o professor Paulo Valim é químico e Embaixador do YouTube Edu no Brasil.