Genética: as ferramentas incríveis por trás da ciência
Sequenciamento genético e edição gênica são conceitos que devem se popularizar, trazendo benefícios incontestáveis para o tratamento de doenças e avanços na agricultura
Uma das áreas mais promissoras da ciência e que mais chamam a atenção dos leigos curiosos é a engenharia genética. Os cientistas dessa área, bem como os pesquisadores em biologia molecular, trabalham para desvendar o chamado “código da vida”, ou seja, o DNA dos seres vivos. A molécula de DNA (ácido desoxirribonucleico) de cada organismo apresenta características únicas, com uma combinação exclusiva de Adenina, Guanina, Citosina e Timina, que são as bases nucleotídicas que compõem o DNA.
A investigação do DNA se baseia em seu mapeamento. Descobrir o sequenciamento genético, ou seja, a sequência em que as bases nucleotídicas se encontram, é necessário para compreender a estrutura de um gene ou genoma. Por sua vez, o gene desvendado revela características de funcionamento das células e microrganismos. O tema pode parecer complexo e distante do cotidiano da maioria das pessoas, mas a verdade é que a genética surpreende em suas aplicações e vai se tornar cada vez mais imprescindível para a humanidade.

Genética na prática
O termo “sequenciamento genético” ganhou popularidade em fevereiro de 2020, quando cientistas brasileiros conseguiram realizar o mapeamento genético do coronavírus em apenas 48 horas, enquanto na média mundial o prazo para o sequenciamento fica em torno de 15 dias. “A capacidade de sequenciar rapidamente pode ajudar na tomada de decisões. Se você tem a sequência, pode responder mais rapidamente se o vírus já está circulando em nível local”, afirmou Ester Cerdeira Sabino, pesquisadora e professora do IMT-USP, em notícia da BBC Brasil.
Além de ressaltar a competência dos cientistas brasileiros, as notícias reforçaram como o sequenciamento é fundamental para identificar mutações, descobrir como o coronavírus se comporta e suas origens, além de trazer conhecimento para o desenvolvimento de vacinas e criação de testes diagnósticos. Mas vale a pena reforçar que o potencial dos estudos em genética vai muito além do sequenciamento do coronavírus. A genética pode revelar muito sobre os seres vivos em geral, desvendar as propriedades hereditárias e bioquímicas da vida, esmiuçando a construção e estrutura das células.
Luta contra o câncer
O propósito da genética se aplica especialmente no combate ao câncer. Já imaginou ser possível detectar um tumor antes mesmo de seu surgimento? O câncer é uma doença que se manifesta quando células do indivíduo sofrem mutações prejudiciais e passam a se comportar de forma indesejada, dando origem ao tumor.
A boa notícia é que a genética será capaz de prever essas mutações para realizar um diagnóstico precoce e colaborar para a criação de tratamentos mais eficazes. Esse caminho já está sinalizado, por exemplo, com o trabalho do projeto Pan-Câncer. Os pesquisadores analisaram o genoma completo de mais de 2,6 mil pacientes com câncer, retratando a forma como cada tumor surge em nível molecular, classificando as mutações nas células cancerosas.
“Você pode comparar a genômica com a invenção do microscópio. Por si só, não é capaz de curar um câncer, mas hoje em dia não é possível conceber o diagnóstico e o tratamento da doença em hospitais sem ela. Como o câncer é o produto de mutações, a genômica está tendo e, acima de tudo terá, um papel transformador”, afirmou o pesquisador Íñigo Martincorena, do Instituto Sanger (Reino Unido), em notícia do El País.
Na Universidade de São Paulo, o Centro de Pesquisas sobre o Genoma Humano e células-tronco (CEGH-CEL) se destaca em pesquisas de localização de genes que produzem doenças genéticas, além de estudos com células-tronco. Entre os trabalhos desenvolvidos, os pesquisadores buscaram uma explicação genética para a microcefalia causada pelo zika vírus nos filhos de gestantes infectadas. “A USP atende pacientes com doenças genéticas desde a década de 1970, época que marcou a introdução genética médica no Brasil”, afirmou a coordenadora Mayana Zatz ao Jornal da USP.
Avanços no campo
A engenharia genética e biologia molecular também beneficiam o agronegócio. Você sabia que a Bayer e a Embrapa mapearam o genoma de um perigoso fungo que prejudica lavouras? Trata-se de uma pesquisa inédita que revelou o sequenciamento genético do Phakopsora pachyrhizi, o fungo que causa a doença ferrugem asiática, a doença mais prejudicial em plantações de soja. “Com a pesquisa, podemos traçar novas linhas para o controle da doença. Isso pode dar origem a novos agroquímicos e até lançamentos de biotecnologia, como variedades transgênicas”, afirmou Dirceu Ferreira Junior, diretor do Centro de Expertise em Agricultura Tropical (CEAT) da Bayer, em notícia da revista Dinheiro Rural.
Outro recente sequenciamento genético importante foi do fungo Metarhizium rileyi, que ataca lagartas da soja. Nesse caso, trata-se de um fungo benéfico para o agricultor, que pode se tornar um aliado para combater pragas na plantação. "Esse fungo atua como um inimigo natural de várias lagartas, como a lagarta-da-soja, a falsa-medideira, o cartucho-do-milho e o curuquerê do algodoeiro”, afirmou o pesquisador da Embrapa Daniel Sosa-Gómez, líder da pesquisa, em comunicado.
A engenharia genética é aplicada no desenvolvimento de sementes transgênicas e trouxe inúmeros benefícios para a agricultura, como a introdução de genes nas sementes capazes de criar uma planta com características de resistência a pragas. O ramo tem suma importância para a agricultura, por desvendar a biologia das plantas e permitir o desenvolvimento de variedades mais produtivas. Uma das possibilidades é a aplicação da chamada metodologia “CRISPR”, que permite a edição gênica, ou seja, editar o DNA de uma planta sem modificá-lo, desse modo se obtém o melhoramento genético da planta, mas não se configura transgenia.